sábado, 4 de abril de 2015

Por que terroristas cortam cabeças?

Por Diogo Bercito - Jornal O Estado de S. Paulo
Vamos ao que está atrás do corte de cabeças. Começamos, então, como de praxe. Uma pergunta.
O Estado Islâmico inventou a decapitação de reféns?
Não. É uma mensagem já antiga e eficiente, entre organizações terroristas. O caso mais marcante é o do jornalista americano Daniel Pearl, decapitado pela Al Qaeda no Paquistão (a história virou filme com a atriz Angelina Jolie em 2007, “O Preço da Coragem”).
Por que o Estado Islâmico corta as cabeças?
O primeiro fator é psicológico. A conquista de Mosul pelo Estado Islâmico no ano passado, antes da instituição de seu “califado”, ocorreu afinal após a retirada do Exército iraquiano. Relatos dão conta do temor propagado pela organização terrorista, entre soldados locais. Apresentar-se como um grupo violento e sádico ajuda, nesse sentido, a garantir vitórias ao Estado Islâmico.
Funciona também como propaganda?
Se pergunte quando foi a última vez que um carro-bomba virou manchete. Eu estive no Iraque recentemente e, mesmo em Bagdá, as notícias de atentados eram lidas com desinteresse. Leitores estão anestesiados, e esses ataques já não têm impacto em uma estratégia de propaganda. As decapitações, por outro lado, recebem uma atenção brutal: a cada refém ocidental morto pelo Estado Islâmico, a organização terrorista ganha as manchetes no mundo inteiro.
Os muçulmanos são bárbaros!
Bem, a decapitação não é exatamente desconhecida no Ocidente. Lembra da guilhotina? Ela era usada até 1977 para cortar cabeças na França, como punição. Não vale a pena ceder a esses julgamentos velozes de que “os árabes são menos desenvolvidos”, porque essa não é a questão estratégica nessa história.
Mas há consenso entre terroristas para decapitar sua vítimas né?
Não. Na verdade, o contrário. Hamas e Hizbullah, por exemplo, não recorrem ao gesto (o que não quer dizer que não sejam violentos). De acordo com um texto publicado pelo “Washington Post”, Ayman al-Zawahiri, líder da Al Qaeda, pediu à franquia iraquiana da organização terrorista que parasse de cortar cabeças. “Muçulmanos nunca vão achar que as imagens são aceitáveis”, disse.
Então não há relação entre islã e decapitação?
Não foi isso o que eu disse. Há na verdade uma referência histórica no Alcorão, o livro sagrado do islã. Um estudo de 2005 cita um trecho que fala em atacar o pescoço de infiéis. Teologicamente, a mensagem teve força ao longo dos séculos. Mas, é claro, isso não significa que o islã equivalha a cortar cabeças. A imensa maioria dos seguidores dessa religião condena a violência. O Estado Islâmico é um grão dentro da diversidade islâmica, e sua visão é das mais radicais.
Quem está cortando as cabeças?
Não se sabe. Mas se imagina que em parte dos casos seja o mesmo homem, apelidado “John jihadista”. Acredita-se que ele seja britânico.